O Estado Maior General das Forças Armadas Angolanas viu-se comprometido após o assassinato de uma criança de 14 anos de idade no Zango II por soldados da Região Militar de Luanda, sob o comando do tenente general Simão Carlitos Wala.
Por Pedrowski Teca
Uma onda de descontentamento de cidadãos angolanos (com estrondosa multiplicação internacional) de vários estratos sociais, que exigem justiça sobre o assassinato, obrigou a instância máxima das Forças Armadas a tomar posição quanto às ocorrências que designou como “circunstâncias trágicas”.
“Sendo que as Forças Armadas Angolanas têm como principal missão a defesa da Nação, onde a população é um dos elementos fundamentais, que merece todo o nosso respeito, protecção e dedicação, lamentamos profundamente o sucedido. Estão em curso medidas que evitem ocorrência de situações semelhantes, no futuro,” lê-se no comunicado divulgado na quarta-feira, 10 de Agosto.
O rapaz de 14 anos, Rufino Marciano António, que residia com os pais na localidade do Walale, bairro Zango II, em Luanda, foi vítima de uma bala à queima-roupa que lhe atingiu a cabeça, na sexta-feira, 5 de Agosto, em consequência das expulsões de moradores que os efectivos das FAA executavam, num processo de demolição forçada de casas na mesma zona.
O menino Rufino, aluno da 3ª classe numa escola comparticipada, procurava entender as razões que levaram os militares do governo a destruírem mais de 600 casas na sua localidade.
“O maior sonho dele era de ser polícia mas foi morto a tiro”, revelou o pai do rapaz.
Os desalojamentos forçados tiveram o início na madrugada de quarta-feira, 3 de Agosto, quando soldados do Posto Comando Unificado (PCU) da Região Militar de Luanda, fortemente equipados e com helicópteros e tractores, invadiram o Zango II, expulsando centenas de famílias, que até ao momento estão a viver em condições desumanas e ao relento.
O Posto Comando Unificado foi criado pelo Presidente da República para assegurar as reservas fundiárias do Estado, mas, segundo os populares, tem sido acusado também de ocupar terrenos privados.
Como se não bastasse, os militares escavaram buracos nas ruas que dão acesso ao bairro, impossibilitando a entrada de carros e motorizadas, mantendo os desalojados sem acesso a água potável e outros bens de primeira necessidade.
As críticas vindas de vários quadrantes da sociedade angolana, questionam como é que num país que se diz estar em período de paz, os moradores do bairro do menino Rufino foram cercados e brutalmente expulsos a tiros por militares do Tenente General Simão Carlitos Wala, e as suas casas injustamente demolidas, sem aviso prévio ou qualquer notificação.
Apercebendo-se do lapso, à última da hora, os moradores foram notificados num dia após a morte do menino Rufino António, ordenados a abandonarem a zona no prazo de 15 dias porque as demolições injustas e forçadas iriam continuar.
O caricato em tal notificação, é a exigência para que os moradores partam as suas próprias casas e abandonem a localidade.
“Considerando que o espaço em que edificou a sua residência constitui propriedade privada da Sociedade de Desenvolvimento da Zona Económica Especial Luanda – Bengo ZEE-EP, vimos por esta via notificá-lo, para o prazo de máximo e improrrogável de 15 dias, promova a demolição voluntária benfeitoria ou obra realizada no referido espaço. Terminado o prazo acima estipulado procederemos a demolição compulsiva”, lê-se no documento assinado no dia sete deste mês por um primeiro-sargento não identificável.
Em contradição, o Estado Maior das Forças Armadas não confirmou que o espaço pertence a ZEE-PE, mas sim o “perímetro de segurança do novo Aeroporto Internacional de Luanda”.
“O Estado Maior General das Forças Armadas Angolanas, tomou conhecimento do grave incidente ocorrido no passado dia 5 de Agosto no Zango Dois, município de Viana, província de Luanda, que envolveu efectivos da Região Militar Luanda e os cidadãos que ocupavam, indevidamente, o perímetro de segurança do novo Aeroporto Internacional de Luanda, em construção, em que foi atingido, mortalmente, um adolescente de 14 anos de idade, chamado Rufino Marciano António”, afirmou.
O Folha 8 constatou no terreno que muitos moradores possuíam documentos que lhes atribuía a propriedade das suas residências, emitidos pelas autoridades locais e outros justificavam que as terras pertenciam-nos por muitos anos porque eram inicialmente zonas de cultivo.
Mas estando num país onde as vítimas são transformadas em agressores, caiu logo o véu da falta de humildade do Estado Maior General, que deixou os angolanos estupefactos ao afirmar que o menino Rufino foi morto num confronto onde a população atacou os militares com duas armadas de fogo.
“O Estado-Maior General alerta a população para evitar afrontar os militares, com armas de fogo, como ocorreu nesse trágico acidente, onde foram capturadas duas armas”, lê-se no comunicado, a desculpa que está a merecer duras críticas da sociedade.
Outras mortes
Uma reportagem feita pela rádio Voz da América (VoA), deu conta da morte de um bebé de 14 meses, que foi decapitado quando uma pá carregadora destruiu a casa onde se encontrava.
“Sabe-se (também) que dois adultos morreram vitimados por ataques cardíacos ou tromboses quando viram as suas casas destruídas”, reportou a VoA.
Em sequência desses acontecimentos, vários cidadãos exigem responsabilização dos perpetradores e consequentemente a exoneração do tenente general, Simão Carlitos Wala, do cargo de comandante da Região Militar de Luanda. Ele destacou-se em 2002, no combate em que tombou o líder fundador do partido UNITA, Jonas Malheiro Savimbi.